A vida após o diagnóstico de Polineuropatia Amiloidotica Familiar por transtirretina
Saiba como é a rotina e quais cuidados são necessários entre aqueles que convivem com Polineuropatia Amiloidótica Familiar, a PAF.
Quando Ana Eliza teve seu diagnóstico confirmado, sentiu muitas dúvidas. Embora estivesse ciente das chances de ser uma pessoa que convivesse com a PAF, uma doença hereditária que já acometia parte de sua família, tinha muitas questões sobre como sua vida seria a partir dali.
Aos 30 anos, ela passou a sentir tonturas, falta de sensibilidade nas mãos e diarreias. Vez ou outra, dores incômodas. Em 2017, aos 34 anos, fez o teste genético por sugestão do médico que havia diagnosticado a tia com Polineuropatia Amiloidótica Familiar por transtirretina. Entendia que, por ser parente de alguém com PAF, tinha chances de conviver com a doença. Quando os médicos confirmaram que os sintomas dela se referiam à doença rara e ela precisaria do tratamento para a vida toda, seu mundo virou de ponta cabeça. O quanto sua rotina mudaria?¹
O caso de Ana Eliza não é isolado. A notícia do diagnóstico positivo de Polineuropatia Amiloidótica Familiar associada à transtirretina, costuma afligir até mesmo aqueles que já conviveram com familiares que vivem com a doença.
Na PAF, a proteína transtirretina (TTR) é produzida de maneira incorreta. Ela forma depósitos de uma substância chamada amiloide que se acumula principalmente nos nervos. A partir daí, começam os primeiros sintomas, a exemplo da diarreia, os formigamentos e as dores que Ana Eliza sentia.¹
De acordo com os pacientes, a dor é um dos sintomas iniciais mais incômodos. Não se trata de uma dor comum: ela pode ser intensa e impedir a realização de atividades simples diárias. Chamada pela literatura médica de “dor neuropática”, ela não passa com qualquer analgésico e acompanha choques, queimação e formigamento. Por isso, logo após a confirmação do diagnóstico de PAF, o primeiro passo do tratamento é avaliar o grau da dor dos pacientes.²
Para avaliar o grau da dor, o corpo médico especializado em Polineuropatia Amiloidotica Familiar associada à transtirretina adota uma escala que vai de 0 a 10, sendo 0 a ausência de dor e 10 uma dor insuportável. No início dos sintomas, como era o caso de Ana Eliza, a dor neuropática costuma ser classificada com pontuação mais baixa. Nos casos em que o diagnóstico é demorado e há uma progressão da doença, com aumento do depósito da substância amiloide no sistema nervoso, os pacientes se queixam de dores mais intensas.³
Os medicamentos que costumam ser eficazes são geralmente os mesmos adotados nos tratamentos de depressão ou epilepsia. Por terem efeitos colaterais diversos, devem ser utilizados com cuidado e acompanhamento médico.²
No Brasil, há dois tipos de tratamento para a Polineuropatia Amiloidótica Familiar associada à transtirretina: o transplante hepático, que deve ser feito no estágio inicial da doença, e o medicamentoso. Ana Eliza optou pela segunda opção.3-4-5-6
O início: Aconselhamento, fisioterapia e alimentação
Após o diagnóstico da doença, é natural que seja feita uma avaliação sobre as dores relatadas pelo paciente. A partir dessa avaliação, é recomendado que o paciente passe por uma consulta com o fisiatra. É ele quem determina quais serão as abordagens ligadas à fisioterapia e à terapia ocupacional. O objetivo nessa fase inicial do tratamento é adaptar o paciente a uma nova rotina.
Um foco de atenção dos médicos nessa fase é explicar ao paciente os impactos que a falta de sensibilidade nos pés e nas mãos podem ocasionar. Assim como Ana Eliza, que foi perdendo a noção da temperatura nas extremidades do corpo, pessoas com Polineuropatia Amiloidótica Familiar por transtirretina podem se queimar e se ferir sem perceber, o que pode ocasionar infecções sérias.7
Depois dessa avaliação inicial, os médicos recomendam uma avaliação da fisioterapia. É ela que fará com que o paciente de Polineuropatia Amiloidótica Familiar por transtirretina não perca a flexibilidade das articulações e resgate um pouco da força. Outro foco de atenção no tratamento é a nutrição. Com a evolução da doença, é comum que os pacientes desenvolvam distúrbios digestivos. Alguns sintomas recorrentes são diarreia e constipação.6-7
Como a Polineuropatia Amiloidótica Familiar por transtirretina faz com que as pessoas percam muita massa muscular, uma das recomendações médicas é que os pacientes adotem uma dieta rica em proteínas, com carnes, leite, queijo, peixes e ovos. Outra recomendação é a alta ingestão de líquidos e de fibras alimentares. Isso ajuda a diminuir a obstipação intestinal. É essencial também uma preferência maior por alimentos orgânicos em detrimento dos que utilizam agrotóxicos.8
Mas e o que não comer? Os médicos dizem que não há alimentos proibidos, mas é bom evitar alimentos laxativos, como sementes, grãos, mamão, alface, couve, entre outros. Os alimentos fermentativos, como feijão, grão de bico, couve-flor, repolho, ovo cozido e bebidas gaseificadas, também devem ser evitados sempre que possível. O mesmo vale para as bebidas alcoólicas.
O aspecto psicológico também deve ser analisado. É comum que pessoas com a doença desenvolvam quadros de ansiedade e depressão, culminando em distúrbios alimentares e perda do apetite. Há também casos de pessoas que, acometidas por náuseas, vômitos e diarreia, param de comer para não sentir mais os sintomas de desconforto.6-7
Por isso é importante que haja um envolvimento multiprofissional dos médicos conforme a doença avança. Profissionais como fisioterapeutas, nutrólogos e psicólogos, entre outros especialistas, podem cuidar de feridas físicas e emocionais do paciente e, assim, ajudá-los a comer e viver bem.6
A importância de um acompanhamento multidisciplinar
Por ser uma doença que afeta vários órgãos, a Polineuropatia Amiloidótica Familiar por transtirretina exige um acompanhamento de muitos médicos, como cardiologistas, oftalmologistas, fisioterapeutas, entre tantos. Mas um deles, em especial, pode fazer toda a diferença desde o primeiro dia: o psicólogo, aquele que poderá tornar o enfrentamento da Polineuropatia Amiloidótica Familiar algo mais tranquilo e leve.6
As dicas dos especialistas na doença e do Ministério da Saúde para enfrentar esse momento delicado são válidas para todos, pacientes e cuidadores: cuide de si mesmo; mantenha a alimentação equilibrada; peça ajuda e divida tarefas; tenha momentos de lazer; não exija muito de si mesmo e procure manter uma atitude positiva diante da vida.10-11
Com a mente saudável e o apoio sentimental, dizem os médicos, a doença fica mais fácil de enfrentar.
Referência Bibliográfica
- Tomás MT, Santa-Clara H, Monteiro E, Carolino E, Freire A, Barroso E. Alterações da força de preensão em portadores de polineuropatia amiloidótica familiar. Acta Med Port. 2010;23(5):803-10.
- Schestatsky P. Definição, diagnóstico e tratamento da dor neuropática. Rev HCPA. 2008;28(3):177-87
- Bottega FH, Fontana RT. A dor como quinto sinal vital: utilização da escala de avaliação por enfermeiros de um hospital geral. Texto Contexto Enferm. 2010 Abr-Jun;19(2):283-90.
- Ministério da Saúde do Brasil, Secretaria de Atenção à Saúde. Portaria Conjunta no 22, de 2 de outubro de 2018. Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas da Polineuropatia Amiloidótica Familiar. Brasília: Diário Oficial da União; 2018. Disponível em: https://www.gov.br/saude/pt-br/assuntos/protocolos-clinicos-e-diretrize… pcdt_polineuropatia_amiloidotica_familiar_2018.pdf Acesso em: 08/03/2023
- Suhr O. Impact of liver transplantation on familial amyloidotic polyneuropathy (FAP) patients’ symptoms and complications. Amyloid. 2003;10(Suppl. 1):77–83. 41. Drent G, Graveland CW, Hazenberg BPC, Haagsma EB. Quality of life in patients with familial amyloidotic polyneuropathy long-term after liver transplantation. Amyloid. 2009;16(3):133–41.
- Conceição I, González-Duarte A, Obici L, Schmidt HHJ, Simoneau D, Ong Ml, et al. “Red-flag” symptom clusters in transthyretin familial amyloid polyneuropathy. J Peripher Nerv Syst. 2016 Mar;21(1):5-9
- Planté-bordeneuve, V., and Kerschen, P. (2013) Transthyretin familial amyloid polyneuropathy, Handbook of Clinical Neurology, 115
- Wixner J, Mundayat R, Karayal ON, Anan I, Karling P, Suhr OB; THAOS Investigators. THAOS: gastrointestinal manifestations of transthyretin amyloidosis – common complications of a rare disease. Orphanet J Rare Dis. 2014;9:61
- Fonseca I. Weight loss and undernutrition in familial amyloidotic polyneuropathy of Portuguese type. Sinapse. 2006;6(1):121-4.
- Associação Portuguesa da Paramiloidose [Internet]. Disponível em: http://www.paramiloidose.com/paramiloi-dose.php?a=2&id=27. Acesso em 08/03/2023
- Ministério da Saúde do Brasil, Secretaria de Atenção à Saúde, Secretaria de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde. Guia prático do cuidador. Série A. Normas e manuais técnicos [Internet]. Brasília: Ministério da Saúde; 2008. Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/guia_pratico_cuidador.pdf. Acesso em 08/03/2023
Para saber mais sobre a PAF e a amiloidose, visite
Amyloidosis Center | Cleveland Clinic
Associação Portuguesa de Paramiloidose (Portugal)
Casa Hunter – Somos todos Raros
Centro de Referência de Paramiloidose Familiar - CHULN (min-saude.pt)
PP-VYN-BRA-1208 / PP-UNP-BRA-2897